3 motivos para conhecer e amar as obras de José Lins do Rego
29 de maio de 2023
Como apontado pelo texto anteriormente, essas obras são narradas em primeira pessoa, criando uma conexão quase instantânea entre Carlos Melo e o leitor. Durante “Doidinho”, por exemplo, o protagonista compartilha sua rotina em uma escola cheia de regras e professores autoritários. Órfão e praticamente sozinho no mundo, Carlinhos, ou Doidinho, apelido que ganha e também dá título ao segundo romance, ele se volta para o mundo dos livros, buscando conforto na trajetória de personagens cujo as jornadas são parecidas com as suas.
Aos poucos, o leitor acompanha Carlos crescer e passar de um menino sensível e que absorvia as coisas com base nessa característica, para um homem com uma moral um tanto quanto contraditória. Ao se tornar um homem, por exemplo, ele adquire plena consciência da exploração degradante dos trabalhadores do engenho.
Vale também observar que a trajetória de Carlinhos se assemelha bastante com a do próprio autor, tirando alguns detalhes pontuais aqui e ali. É essa característica um dos fatores que contribui muito para a mistura orgânica que José Lins do Rego traça ao fazer uma narrativa que envolve denúncias sobre uma época muito específica do nosso país, mas também algo que é pessoal e expressa os sentimentos humanos de forma complexa.
Na medida em que Carlos cresce e muda, o Brasil também. Traçar um paralelo entre as mudanças do protagonista e das coisas ao seu redor é um dos (vários) triunfos da narrativa de José Lins do Rego.
Outra coisa que o autor faz muito bem, no entanto, é essa mistura entre o regionalismo e o modernismo.
3) Fogo Morto
Considerado por muitos a obra-prima suprema de José Lins do Rego, aqui o autor passa a escrever sua história por meio de um narrador onisciente e divide sua narrativa em três momentos distintos.
No primeiro, ele conta as desventuras de José Amaro, que mora no Engenho de Santa Fé e passa por uma série de provações; no segundo, a figura principal é Lula de Holanda, senhor de engenho de Santa Fé. Aqui, a trama faz uma breve retomada até o momento em que o engenho foi construído, chegando até os momentos de sua decadência; e, por fim, a história aborda as jornadas de Capitão Vitorino pelas estradas que cercam Santa Fé.
Os três momentos do livro se cruzam, criando uma conexão entre os três personagens e suas respectivas trajetórias.
Mas por que esse livro é considerado uma obra-prima?
Ao misturar essas três narrativas, ele não apenas explora o estopim de um Brasil mudado e cruel, como também a vida de pessoas que foram profundamente afetadas por esses mesmos fatores, ainda que de formas bem diferentes. Um romance “híbrido”, que mistura ficção e realidade, “Fogo Morto” é poderoso pois explora tudo que existe de bom nas histórias de José Lins do Rego: sua escrita pessoal e sincera, e ao mesmo tempo com o tom dramático e pertinente.